• Ele vem aos pouquinhos e te conquista sem perceber. A mamãe Camilla Pitanga conta pra gente como foi aprender a amar seu filho.

    Ser mãe sempre fez parte dos meus planos. Era algo natural e esperado. Aconteceria em algum momento da minha vida. Mas nunca foi o objetivo dela. Descobri que estava grávida com 4 semanas por meio de um teste de farmácia. Por orientação de uma amiga obstetra, esperei completar 6 semanas para realizar a ultrassonografia e ver se tinha embrião e batimento fetal. Nesse mesmo dia, fui almoçar com uma amiga que estava tentando engravidar e há pouco tempo havia tido uma gestação sem embrião. Durante o almoço fui surpreendida com uma pergunta que me deixou assustada: "você já o ama?". Claro que não. Eu não posso amar quem eu não conheço. Eu não posso amar quem eu sequer sei se existe ainda. Então, ela me interrompeu e disse: "talvez você não o quisesse. Porque eu já amava o meu desde que descobri que estava grávida". 

    Como eu disse, a gestação dela não tinha embrião. Então, ela amou o saco gestacional. Você pode amar a ideia de ser mãe. A ideia de ter um filho. Mas pode amar quem ainda não existe?

    Ali, eu percebi que os julgamentos da maternidade começavam antes mesmo dela existir de fato e  eu não estaria imune a isso.

    Quase semanalmente eu era indagada se já o amava: "Você chorou quando ouviu o coração?". "Você conversa com a barriga?". "Você canta pra barriga durante o banho?". Não. Não. Não.

    Mas ninguém me perguntava se eu estava tomando as vitaminas para que ele se desenvolvesse bem. Se eu estava seguindo o pré-natal a risca. Se eu dobrei minha carga horária de trabalho pra poder comprar o melhor pra ele. Pra mim, isso é demonstração de amor.

    Quando eu decidi que não faria um ensaio gestante, pareceu que eu ofendi uma irmandade. Eu não tinha o direito de não achar bonita a minha barriga enorme manchada, que mais parecia o calçadão de Copacabana. Ou meu umbigo saliente que simulava uma bola de golfe. Eu tinha obrigação de fazer. Era isso que significava amor. Besteira!

    O dia do parto é, sem duvida, muito emocionante! Ver seu filho pela primeira vez é um momento único e especial. 

    Mas espera! Tinha algo errado! Eu não senti aquele amor mágico imediato que todos dizem que sentem. Meu momento foi ainda pior porque me senti culpada e envergonhada por isso. Eu menti.

    Então eu fui pra casa com um recém nascido. E a vida com um bebê é um pouco diferente dos comerciais.  Amamentar não foi tão fácil e plácido como os encartes do Ministério da Saúde fazem parecer. O cansaço me dominava. Se eu estivesse no meio do banho e ele chorasse, largava tudo e ia correndo. E assim com o almoço, o jantar, o sono...comigo. Tinha que estar disponível 100% do tempo. Eu estava exausta! Era um ciclo sem fim de fraldas, choros, amamentação e tudo se repetia sem parar.

    Por que não estava sendo aquela felicidade toda que eu imaginava? Por que eu não estava maquiada sorrindo com um bebê arrumado nas fotos do Instagram?

    As vezes o olhava e pensava o quão perfeito era e o quão grata eu deveria ser. No mesmo momento, eu chorava por me sentir exaurida. Eu sempre fui ativa, espontânea e, de repente, me vi exausta e robótica. Me sentia feliz e triste ao mesmo tempo. 

     

    Por mais que um dia eu recupere minha liberdade, minha vida nunca mais será a mesma. A espontaneidade, o descompromisso deram lugar a rotina de um bebê. É preciso assimilar esse momento. Não é só um bebê recém nascido. Há uma mãe recém nascida. E que precisa igualmente ser cuidada. 

    Passei muito tempo me sentindo culpada por estar tão cansada ou não parecer tão feliz quanto eu achei que deveria estar.

    Mas aprendi que o amor não é mesmo imediato. Vem aos pouquinhos. Te conquista sem perceber. E que está tudo bem se você passa a gostar de filas do banco pra poder ficar um pouquinho a mais na rua. Ou se você comemora quando alguém quer ficar com ele no colo pra você ir ao mercado sozinha. Viver integralmente a maternidade foi enlouquecedor pra mim. Mas a natureza é sábia. E quando eu estava no meu limite da exaustão, veio a mais linda recompensa de todo o esforço.

    Foi quando eu estava há quase 60 dias sem dormir mais que 3 horas seguidas, resmungando e esbravejando as 02:00 da manhã, que ele focou os olhinhos em mim pela primeira vez. Quando semanas depois, deu o primeiro sorriso intencional. Meses depois, meio desajeitado, me fez o primeiro carinho. 

    É assim que nasce o amor! Não é imediato. Mas é singular. E a maior prova de amor de uma mãe é amar o filho pelo que ele é. Por quem você descobriu e aprender a amar.

    Hoje, tenho o maior amor do mundo.

    E já me perdoei por todas as vezes que chorei sozinha. Que duvidei de mim. Que desejei desaparecer umas horas. Ou que pensei em deixá-lo chorar 5 minutinhos sem acudi-lo para conseguir terminar meu banho. Isso não fez de mim uma mãe ruim. E sim, uma mãe real.

    Texto enviado por Camilla Pitanga, pediatra e mãe do Enrico, de 8 meses.

    A Infanti incentiva mães e pais a compartilharem suas histórias. As opiniões publicadas neste texto são pessoais e não necessariamente representam a visão da Infanti.